CIDADES
Ludopatia: quando o vício em apostas vira caso de direito previdenciário
   
A maior parte dos casos registrados envolve homens jovens, entre 18 e 39 anos

Por Juliane Lang Piazzeta Giacomazzi, advogada
31/07/2025 10h46

A popularização dos jogos de aposta online, combinada com a facilidade de acesso por meio de aplicativos e sites, trouxe à tona um problema grave de saúde pública: o vício em apostas, clinicamente conhecido como ludopatia. Essa condição já é reconhecida como um transtorno mental e está gerando reflexos cada vez mais evidentes na sociedade e no sistema jurídico brasileiro.

A ludopatia se caracteriza pela perda de controle sobre o ato de apostar. O indivíduo acometido pelo transtorno continua jogando compulsivamente, mesmo diante de prejuízos financeiros, familiares, sociais e profissionais. Trata-se de uma doença com impactos profundos na saúde mental e na vida cotidiana.

O cenário se agrava quando observamos os dados previdenciários. De acordo com informações recentes, o número de auxílios-doença concedidos pelo INSS a segurados diagnosticados com ludopatia aumentou mais de 2.300% entre junho de 2023 e abril de 2025. Esse crescimento impressionante evidencia que o vício em jogos não é apenas um problema individual, mas uma questão de saúde coletiva e jurídica.

A maior parte dos casos registrados envolve homens jovens, entre 18 e 39 anos — uma faixa etária economicamente ativa e que, muitas vezes, representa o sustento familiar. Quando essas pessoas perdem sua capacidade laboral devido ao transtorno, o impacto se estende às famílias e à economia como um todo.

Por se tratar de uma doença mental reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), a ludopatia pode justificar o afastamento do trabalho e o recebimento de benefícios previdenciários como o auxílio-doença ou até mesmo a aposentadoria por invalidez, nos casos mais graves.

Para isso, é necessário que o trabalhador esteja contribuindo com o INSS e comprove, por meio de laudos médicos e perícia, que está temporariamente ou permanentemente incapaz de exercer sua atividade profissional em decorrência do transtorno.

Nesses casos, o papel do advogado previdenciarista é fundamental. Ele auxilia o segurado a reunir a documentação adequada, entender seus direitos e enfrentar a burocracia do sistema previdenciário, que muitas vezes nega o benefício em uma primeira análise.

É importante destacar que o tratamento da ludopatia envolve acompanhamento psiquiátrico, psicológico e, em muitos casos, medicamentoso. O afastamento do trabalho pode ser essencial para a recuperação do paciente, o que reforça a necessidade de acesso ao benefício previdenciário.

O reconhecimento da ludopatia como motivo de incapacidade laboral também reforça a importância da discussão sobre políticas públicas de prevenção ao vício em jogos. A regulamentação das apostas e a educação sobre seus riscos são medidas urgentes para conter o avanço da doença.

Além da via administrativa, casos de ludopatia também podem gerar demandas judiciais — tanto para garantir o benefício previdenciário quanto para responsabilizar empresas que promovem jogos sem critérios de proteção ao consumidor vulnerável.

Nesse contexto, o Direito de Família também pode ser impactado. Muitos dependentes buscam orientação jurídica para lidar com as consequências do vício de um ente querido, como dívidas, separações ou até disputas relacionadas à guarda de filhos e partilha de bens.

O Direito do Consumidor, por sua vez, pode atuar em situações em que as plataformas de apostas agem com abusividade, falta de transparência ou publicidade enganosa, incentivando o comportamento compulsivo de seus usuários.

A atuação jurídica, portanto, é multidisciplinar. 

A ludopatia é uma doença séria e silenciosa. O acolhimento, a informação e a atuação jurídica competente podem ser fundamentais para que o paciente retome sua dignidade, seus direitos e sua saúde.


   

  

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