O adolescente se olha no espelho e se acha diferente. Constata facilmente que perdeu aquela graça infantil quem em nossa cultura, parece garantir o amor incondicional dos adultos, sua proteção e solicitude imediatas. Essa segurança perdida deveria ser compensada por um novo olhar dos mesmos adultos, que reconhecesse a imagem púbere como sendo a figura de outro adulto, seu par iminente. Ora, esse olhar falha: o adolescente perde (ou, para crescer, renuncia) a segurança do amor que era garantido à criança, sem ganhar em troca outra forma de reconhecimento que lhe pareceria, nessa altura, devido.
Ao contrário, a maturação, que, para ele, é evidente, invasiva e destrutiva do que fazia sua graça de criança, é recusada, suspensa, negada. Talvez haja maturação, lhe dizem, mas ainda não é maturidade. Por consequência, ele não é mais nada nem criança amada, nem adulto reconhecido.
O que vemos no espelho não é bem nossa imagem. É uma imagem que sempre se deve muito ao olhar dos outros. Ou seja, me vejo bonito ou desejável se tenho razões de acreditar que os outros gostam de mim ou me desejam. Vejo, em suma, o que imagino que outros vejam. Por isso o espelho é ao mesmo tempo tão tentador e tão perigoso para o adolescente: porque gostaria muito de descobrir o que os outros veem nele. Entre a criança que se foi e o adulto que ainda não chega, o espelho do adolescente é frequentemente vazio. Podemos entender então como essa época da vida possa ser campeã em fragilidade de autoestima, depressão e tentativas de suicídio.
Parado na frente do espelho, caçando as espinhas, medindo as novas formas do seu corpo, desejando e ojerizando seus novos pelos ou seios, o adolescente vive a falta do olhar apaixonado que que merecia quando criança e a falta de palavras que o admitam como par na sociedade dos adultos. A insegurança se torna assim o traço próprio da adolescência.
Grande parte das dificuldades relacionais dos adolescentes, tanto com adultos quanto com seus coetâneos, deriva dessa insegurança. Tanto uma timidez apagada quanto o estardalhaço maníaco manifestam as mesmas questões, constantemente à flor da pele, de quem se sente não mais adorado e ainda não reconhecido: será que sou amável, desejável, bonito, agradável, visível, invisível, oportuno, inadequado, etc? (Texto extraído do livro de Contardo Calligaris: A Adolescência)
Nos dias atuais, soma-se a isso, outro espelho, talvez o mais relevante: o celular, suas mensagens sedutoras, normalmente distantes do que é de fato realidade e que tem como objetivo convencer o adolescente de como deve ser sua imagem, sua vida e seus valores. E, então, numa fase de vulnerabilidade, ainda construindo sua identidade, sua personalidade e sua autoestima, ele se frustra constantemente por não alcançar esses padrões irreais, o que gera ainda mais insegurança. É um mundo perigoso, com um poder muito grande de influência. É preciso, enquanto pais e cuidadores, que olhemos com muito cuidado para esse novo espelho.